Se alguém te perguntasse o que é “qualidade de vida”, o que você responderia? Talvez você tivesse certa dificuldade em responder prontamente a essa pergunta. Seria mais fácil dizer que é melhor estar livre do que estar preso, estar saudável do que estar doente, e se sentir relaxado e não estressado. De fato, como veremos a seguir, “qualidade de vida” é um termo complexo e difícil de se definir.

Até a década de 1940, as discussões a respeito de bem-estar individual giravam em torno exclusivamente da saúde. Ou seja, uma pessoa saudável era aquela que não estava doente. No entanto, a nova compreensão de que a ausência de doença não significa necessariamente uma vida plena e salubre levou à necessidade de se avaliar a qualidade de vida além do que se refere à saúde, englobando aspectos positivos e negativos da vida. O conceito de qualidade de vida passa a ser mais amplo e englobar diferentes aspectos da vida, muito além da saúde física. Indo mais além, além de ser um conceito com múltiplas faces, a percepção de qualidade de vida é extremamente subjetiva.

Veja as seguintes situações: uma pessoa pode decidir viver em um grande centro urbano devido ao fácil acesso a serviços culturais e eventos sociais. Um outro indivíduo pode escolher viver em uma área mais rural, pois valoriza um ritmo de vida mais lento, sem precisar enfrentar o trânsito das grandes cidades, e ter mais acesso à natureza. Certamente, a percepção de qualidade de vida é muito diferente para essas duas pessoas. Lembra daquele ditado “a beleza está nos olhos de quem vê”? Assim, diversos fatores podem influenciar a percepção e a vivência da qualidade de vida. A qualidade de vida só pode ser avaliada de forma precisa pela pessoa em questão, e a avaliação individual provavelmente muda de acordo com o momento de vida dessa pessoa.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), qualidade de vida é definida como “a percepção individual que uma pessoa tem sobre a sua posição na vida, no contexto cultural e de valores no qual ela está inserida, e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”. O que isso quer dizer? Que a qualidade de vida depende de vários fatores:

  • Saúde física
  • Saúde mental
  • Nível de independência
  • Relacionamentos sociais
  • Crenças pessoais
  • Relação com o ambiente no qual se vive

A qualidade de vida, assim, é a extensão na qual as necessidades humanas básicas e objetivas são preenchidas, em relação à percepção de bem-estar subjetivo (individual e em grupo). As necessidades humanas básicas estão relacionadas aos seguintes:

  1. Recursos para subsistência: alimentação, moradia, serviços de saúde, acesso a água potável e ar com boas condições
  2. Condições para manutenção da capacidade reprodutiva
  3. Segurança
  4. Afeto: envolve a capacidade/possibilidade de desenvolvimento de ligações afetivas a pessoas e coisas; solidariedade, respeito, tolerância, generosidade, paixão e receptividade
  5. Acesso à informação
  6. Participação em sociedade e sensação de pertencimento
  7. Acesso a atividades de lazer: incluindo viagens, atividades de relaxamento, acesso à natureza
  8. Espiritualidade
  9. Condições para expressão de emoções/criatividade
  10. Reconhecimento da identidade pessoal
  11. Liberdade e mobilidade

A observação de o quanto os fatores acima descritos estão sendo preenchidos em nossa vida serve de base para a reflexão de como podemos melhorar nossa qualidade de vida. Nesse contexto, é claro que a melhora dos indicadores econômicos e a garantia de acesso ao trabalho e à educação são medidas fundamentais. No entanto, deve-se ressaltar que tais indicadores econômicos objetivos não devem ser considerados o objetivo final, mas sim como um caminho para uma melhor qualidade de vida. Algumas dessas mudanças dependem de políticas públicas e estratégias orquestradas do ponto de vista da comunidade/sociedade na qual a pessoa está inserida.

Mas e do ponto de vista individual? O que você pode fazer para melhorar sua qualidade de vida?

 

Mantenha relacionamentos saudáveis

Os nossos relacionamentos, sejam eles familiares, românticos ou de amizade, têm um importante impacto na nossa qualidade de vida. Estudos mostram que relacionamentos saudáveis, com pessoas que nos dão suporte, desde a tenra infância até a idade adulta, são fundamentais no desenvolvimento de habilidades para lidarmos com traumas, adversidades e outras fontes de estresse (resiliência). Além disso, relacionamentos saudáveis aumentam nossa sensação de felicidade, satisfação com a vida e bem-estar psicológico.

 

Mantenha hábitos alimentares saudáveis

A subsistência humana e a garantia de suas capacidades reprodutivas, de crescimento e desenvolvimento dependem de energia, a qual é adquirida por meio da nutrição. Além disso, a nutrição adequada é fundamental para a manutenção da saúde física e mental. Orientações individualizadas a respeito dos hábitos alimentares são muito importantes, mas alguns direcionamentos gerais podem ser recomendados, especialmente em relação ao que sabemos a respeito da prevenção de doenças e manutenção do peso corporal. Nesse sentido, de forma geral, tente manter uma ingestão adequada de água, da ordem de 35 mL/Kg/dia. A dieta deve ser rica em frutas, legumes e vegetais, bem como pobre em gorduras (especialmente as saturadas). Sementes e castanhas são muito bem-vindas. Dê preferência a carnes brancas (frango e peixe), preferencialmente cozidas, assadas ou grelhadas. Limite o consumo de carnes vermelhas a no máximo 3 vezes por semana. Controle o consumo de sal e evite o tabagismo.

 

Faça atividade física

A prática regular de atividade física é um dos pilares para a manutenção da qualidade de vida. Além de ajudar na manutenção do peso corporal, redução da massa de gordura e ganho/manutenção de massa muscular, a atividade física tem o potencial de auxiliar no combate aos sintomas depressivos, no alívio da ansiedade e do estresse, na melhora da memória e do padrão de sono. Se você não gosta de fazer atividade física sozinho, busque atividades ao ar livre ou em grupo. Não precisa ser nenhum fanático por academia! A OMS recomenda a prática de pelo menos 150-300 minutos por semana de atividade física moderada. E estudos mostram que até mesmo a prática de 30 minutos por dia já é suficiente para fazer a diferença. Lute contra o sedentarismo e reduza o seu tempo de tela (televisão, computador, smartphone, tablet).

 

Tenha boas noites de sono

A qualidade do seu sono afeta diretamente sua qualidade de vida. Seja melhorando sua produtividade no trabalho, seu equilíbrio emocional, sua capacidade criativa e até mesmo seu peso. Uma boa noite de sono tem efeito positivo sobre a saúde física e mental. Quem dorme bem se sente mais bem-disposto e tem menos fadiga/cansaço. Algumas pessoas têm muita dificuldade para dormir, e em alguns casos medicamentos podem ser necessários. No entanto, algumas medidas simples de higiene do sono podem ser bastante eficazes. Entre elas, destaco:

  1. Evite comer e fazer atividade física muito próximo da hora de ir dormir
  2. Só vá para a cama quando a tiver intenção de dormir
  3. Evite ter/assistir televisão no quarto e reduza o uso do celular na cama
  4. Ouvir sons/músicas de relaxamento podem ajudar
  5. Faça meditação

 

Encontre sentido na sua vida e no seu trabalho

A carreira que exercemos/escolhemos é um fator que tem papel importante na nossa identidade e em como nos sentimos em relação a nós mesmos. Independente do quanto você ganha, se você enxerga seu trabalho como infrutífero ou sem sentido, ele terá um efeito muito negativo na sua saúde física e mental. E mesmo que você não consiga mudar a sua carreira, você ainda pode encontrar sentido por meio de mudanças na sua rotina de trabalho e no engajamento em outras atividades que te tragam prazer, como hobbies e serviços voluntários.

 

Valorize e invista no seu lazer

Nosso tempo livre e de lazer é muito mais importante do que você imagina. Estamos cada dia mais ocupados, atolados em trabalho, muitas vezes sentindo que nunca temos tempo disponível para fazer o que gostamos. Porém, não permitir a si mesmo um tempo para relaxamento e diversão é um grande erro. Garantir um tempo adequado para lazer e diversão tem o potencial de reduzir o seu nível de estresse, melhorar o seu humor e suas habilidades para a solução de problemas. Você vai, inclusive, se sentir com mais energia e até mais motivado para exercer o seu trabalho.

 

 

Referências

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