Papilomavírus humano (HPV) é o nome dado a um grupo de mais de 200 vírus de DNA que infectam somente seres humanos. A infecção pelo HPV ocorre principalmente durante relações sexuais desprotegidas (sexo oral, vaginal ou anal), mas também pode ocorrer transmissão de mãe para filho durante o parto, pela saliva e por contato com material perfurocortante contaminado. Trata-se de uma infecção extremamente comum, de forma que, aos 50 anos, 80% das mulheres terão sido infectadas em algum momento da vida.
A infecção pelo HPV pode levar à formação de verrugas (genitais ou de pele). Porém, muitas pessoas infectadas não apresentam sintomas e isso favorece a disseminação da infecção. De maneira geral, o sistema imunológico consegue eliminar a infecção em até dois anos. Porém, em alguns casos, ela pode persistir e aumentar o risco de doenças como o câncer. Sabe-se que aproximadamente 40 tipos de HPV podem infectar a região anal e genital e, entre eles, 13 tipos são considerados de alto risco, ou seja, estão associados ao câncer. Além disso, os HPV de alto risco também podem causar câncer em outras partes de corpo. Importante lembrar que os tipos de HPV que causam verrugas genitais não são os mesmos que causam câncer.
Entre os tipos de câncer associados ao HPV, o mais comum é o câncer do colo de útero. Hoje, sabe-se que o HPV é a causa de quase todos os casos desse tipo de câncer. Em todo o mundo, o câncer de colo de útero é o quarto câncer mais comum entre as mulheres, com uma estimativa de 570.000 novos casos por ano em todo o mundo, representando 6,6% de todos os cânceres nas mulheres. No Brasil, o Instituto Nacional do Câncer (INCA) estima que em 2020 sejam diagnosticados 16.590 novos casos da doença. Em média, o intervalo de tempo entre a infecção e o desenvolvimento de câncer é de 15-20 anos. Porém, o tempo pode ser mais curto na presença de outros fatores de risco, como deficiência do sistema imune (por exemplo, infecção concomitante pelo HIV ou outras infecções sexualmente transmissíveis) e tabagismo.
O HPV também está associado ao desenvolvimento de câncer de vulva e de vagina. No entanto, ao contrário do câncer de colo de útero, a porcentagem de casos associados ao HPV é menor: vulva (29-43%) e vagina (cerca de 70%). São tumores bem menos comuns que o câncer de colo de útero, mas quando associados ao HPV costumam ocorrer em idade mais jovem. Entre os homens, a infecção pelo HPV pode levar ao desenvolvimento de câncer de pênis. Esse tipo de câncer não é tão frequente e, assim como nos casos de câncer de vulva e de vagina, quando o HPV é o agente causador o câncer costuma surgir em homens mais jovens.
Outro tipo de câncer associado ao HPV é o câncer de canal anal (ânus), sendo que até 93% dos casos dessa doença mostram relação com a infecção. Esse tipo de câncer também é pouco comum e ocorre mais frequentemente em mulheres do que em homens. Porém, homens que fazem sexo com homens apresentam risco aumentado tanto de infecção pelo HPV quanto de câncer de canal anal.
Por fim, o risco de câncer de cavidade oral e orofaringe (garganta) é aumentado em 2-4 vezes na presença de infecção por HPV de alto risco. Ao longo dos últimos anos, nos EUA, observa-se um aumento dos casos de câncer de garganta associado ao HPV e redução dos casos não associados ao HPV. Os cânceres de cavidade oral e garganta associados ao HPV tendem a acontecer em pessoas mais jovens e que apresentam comportamento sexual de risco.
A prevenção do HPV envolve diversas estratégias que podem ser direcionadas à redução do risco de infecção e a detecção precoce e tratamento de lesões causadas pelo HPV e que podem se transformar em câncer.
Para a prevenção da infecção, recomenda-se:
- Educação sexual para meninos e meninas, envolvendo tópicos como início da atividade sexual e prática de sexo protegido.
- Fornecimento e orientação sobre uso de camisinha.
- Orientação sobre os riscos associados ao tabagismo.
- Vacinação.
A vacina contra o HPV é uma forma segura e eficaz de proteção contra a infecção. Atualmente, no Brasil, existem duas vacinas disponíveis. A vacina quadrivalente (Gardasilâ) protege contra os tipos 6, 11, 16 e 18, e a vacina bivalente (Cervarixâ) que protege contra os tipos 16 e 18. Sabe-se que existe proteção cruzada contra tipos de HPV não cobertos pela vacina, de forma que as duas são consideradas igualmente eficazes para a prevenção do câncer de colo de útero. O efeito da vacina é melhor quando administrada antes do primeiro contato com o vírus. Por isso, é recomendada a aplicação a meninas e meninos antes da primeira relação sexual. No Brasil, a vacina quadrivalente está incluída no calendário vacinal do Sistema Único de Saúde (SUS), sendo administrada a meninas de 9-14 anos e meninos de 11-14 anos. Vale lembrar que a vacina não consegue curar uma infecção já instalada.
A detecção precoce de lesões causadas pelo HPV é a base para a realização do rastreamento de câncer de colo de útero com exame citopatológico (Papanicolaou). O achado dessas lesões iniciais permite seu tratamento, reduzindo-se o risco de desenvolvimento de câncer. Além disso, permite a detecção do câncer em estádio mais precoce, com maior chance de cura. No Brasil, o rastreamento é recomendado a partir dos 25 anos e estende-se até os 64 anos. Os dois primeiros exames devem ser feitos com intervalo de um ano e, se forem negativos, os demais serão feitos a cada três anos. Vale lembrar que mesmo as mulheres que foram vacinadas contra HPV devem ser submetidas ao rastreamento para câncer de colo uterino.
No caso dos cânceres de vulva, vagina, pênis, ânus e cavidade oral/garganta não existe rastreamento que tenha se mostrado eficaz. Os dados de prevenção desses cânceres com a vacina contra HPV ainda são iniciais, mas sugerem que a vacina também é eficaz em evitar esses tipos de câncer. Recomenda-se atenção ao surgimento de sinais e de sintomas suspeitos, como surgimento de verrugas, feridas que não melhoram em até 2-3 semanas, sangramento, rouquidão, dor para engolir. Nessas situações, recomenda-se procurar rapidamente um profissional de saúde.
Referências
- World Health Organization. Human papillomavirus (HPV) and cervical cancer fact sheet. Disponível em: https://www.who.int/en/news-room/fact-sheets/detail/human-papillomavirus-(hpv)-and-cervical-cancer. Acessado em 10 de fevereiro de 2020.
- Centers for Disease Control and Prevention. HPV and Cancer. Disponível em: https://www.cdc.gov/cancer/hpv/index.htm. Acessado em 10 de fevereiro de 2020.
- Palefsky JM, Cranston RD. (2019). Virology of human papillomavirus infections and the link to cancer. In T.W. Post, Dizon DS, Aboulafia DM (Eds.), UptoDate.
- Palefsky JM. (2019). Human papillomavirus infections: Epidemiology and disease associations. In T.W. Post, Hirsch MS (Ed.), UptoDate.
- Instituto Nacional de Câncer (INCA). Estatísticas de câncer. Disponível em: https://www.inca.gov.br/numeros-de-cancer. Acessado em 14 de fevereiro de 2020.
- Siegel RL, Miller KD, Jemal A. Cancer statistics, 2020. CA Cancer J Clin. 2020;70(1):7–30.