Terminou em 10 de setembro a 20ª Conferência Mundial de Câncer de Pulmão, reunindo mais de 7.500 especialistas no assunto, na cidade de Barcelona, na Espanha. Foram quatro dias de muita discussão e troca de experiências com resultados promissores de vários estudos. Alguns, irão mudar nossa prática clínica em curto espaço de tempo e, outros, trazem esperança de importantes mudanças no futuro. Comentarei a seguir os resultados mais importantes desse congresso.
O primeiro estudo é o LIBRETTO TRIAL, estudo de fase 1/2, que testou uma droga chamada Selpercatinib (LOX-292) para aqueles pacientes com adenocarcinoma de pulmão metastático com fusão do gene RET (cerca de 2% de todos adenocarcinomas). Essa nova droga mostrou impressionantes taxas de respostas de 68% em pacientes já tratados com outras terapias e 85% naqueles virgens de tratamento, com duração média de resposta de 20 meses, e taxas de resposta de 91% nas metástases cerebrais (50 % dos pacientes com fusão de RET evoluem com meta cerebral). Como os pacientes demoram a progredir, a mediana de sobrevida livre de progressão não foi atingida. A fusão de RET até então não tinha um tratamento personalizado e as medicações usadas como quimioterapia convencional, inibidores de multi-kinases e imunoterapia não tinham bons resultados.
Outro estudo apresentado na plenária do congresso foi o CASPIAN TRIAL. Estudo que comparou a associação de Durvalumab (imunoterapia) com quimioterapia baseada em platina + Etoposideo versus quimioterapia isolada para pacientes com câncer de pulmão pequenas células doença extensa. Houve aumento de sobrevida global de 10,3 para 13 meses de mediana em favor da combinação, com 54% dos pacientes do braço combinação vivos em 12 meses. O perfil de eventos adversos é parecido com os já conhecidos pela imunoterapia, sendo menos intensos se comparados à quimio. Esse estudo ainda tem outro braço, que compara a associação de dois imunoterápicos – durvalumab+tremelimumab – com a quimioterapia. A comparação desse braço com quimio isolada ainda não foi apresentada.
Outros estudos interessantes foram os relacionados à prevenção secundária, ou seja, screening para câncer de pulmão. Já sabemos que o screening com tomografia de baixa dose na população de alto risco reduz a mortalidade por câncer de pulmão em cerca de 20%. O que esses estudos mais recentes avaliaram foram protocolos mais detalhados e mais amplos para definir quem são os pacientes de alto risco e com isso fazer o screening na população correta. Outro estudo avaliou análise de RNAm na população de alto risco para definir subgrupos nos quais o intervalo de tomografia de baixa dose poderia ser maior, o que permitiria melhor alocação dos recursos destinados nessas estratégias.
Um trabalho interessante do Grupo Brasileiro de Oncologia Torácica (GBOT) analisou a incidência das principais mutações genéticas em adenocarcinoma de pulmão na população brasileira. Encontrou porcentagens de mutação do EGFR de 23%, KRAS 20%, ALK 5%. Essas avaliações permitem um melhor entendimento do perfil genético da nossa população e o desenvolvimento de políticas específicas e direcionadas para os brasileiros com câncer de pulmão.
Foi apresentado, ainda, o desenho do estudo FLAURA 2 que vai tentar responder se a associação de Osimertinib + quimioterapia em 10 linha para adenocarcinoma de pulmão metastático com mutação de EGFR é superior a Osimertinib isolado. Muito foi discutido também sobre a personalização do tratamento. A importância cada vez maior do sequenciamento genético por New Generation Sequencing (NGS) para definir possíveis alvos de tratamento e na progressão da doença para análise dos mecanismos de resistência tem levado a discussão de como tornar essas avaliações disponíveis para todos, visto o elevado custo do exame.
Outro assunto bastante discutido foi sobre a importância e quais os melhores biomarcadores para definir os pacientes que responderão ou não à imunoterapia. Foi mostrado novamente dados semelhantes aos resultados já mostrados na ASCO deste ano. Uma análise do estudo de fase III Mystic mostrou que mutações no gene STK11 e KEAP1 estão associados ao pior prognóstico e a pior resposta ao tratamento, tanto com quimioterapia quanto com imunoterapia. E, para esses pacientes, a associação de imunoterapia a quimioterapia não parece adicionar benefício à quimio isolada. Em contrapartida, pacientes com mutação no gene ARID1A tiveram maior taxa de resposta e maior sobrevida à imunoterapia, que sugere que esse gene possa ser preditor de resposta à imunoterapia. Outro biomarcador muito discutido foi o Tumor Mutation Burden (TMB), que na avaliação de resposta ao Pembrolizumab não teve associação direta, ou seja, as repostas ao Pembrolizumab não dependiam da taxa de TMB.
Houve, também, a atualização de estudos importantes como o Keynote 024, que mostrou ganho de sobrevida global com Pembrolizumab em pacientes com carcinoma de não pequenas células de pulmão metastático (tanto adeno quanto CEC), comparado com quimioterapia em primeira linha para pacientes com PDL-1> 50%. A taxa de sobrevida em três anos é de 44% para Pembrolizumab contra 25% para quimioterapia. Deve-se considerar que até 60% dos pacientes fizeram crossover, ou seja, receberam Pembrolizumab em linhas subsequentes. Foram mostrados os dados finais do estudo IMpower 131, que comparou outra imunoterapia, Atezolizumab + quimio (carboplatina + nab-paclitaxel) vs quimioterapia isolada em pacientes com carcinoma escamoso de pulmão metastático. O estudo foi negativo para sobrevida global na população ITT, mostrando apenas ganho de sobrevida livre de progressão.
Esse foi um apanhado dos principais resultados da Conferência Mundial de Câncer de Pulmão 2019, realizado na cidade de Barcelona, na Espanha, com várias novidades e importantes discussões. Medicamentos novos em fases iniciais de pesquisa e outros mais próximos de serem usados no dia a dia. Este congresso vem ganhando importância a cada ano com a reunião de especialistas em câncer de pulmão de todo o mundo. A próxima conferência está marcada para agosto de 2020, em Singapura. Espera- se alguns resultados também importantes no Congresso Europeu de Oncologia (ESMO), que tem início na próxima semana também em Barcelona, como a apresentação dos dados de sobrevida global do estudo FLAURA e as atualizações do estudo Checkmate 227. A boa notícia é que nossos pacientes com câncer de pulmão metastático estão vivendo mais e melhor e a cada congresso isso se torna mais claro é palpável.