Por isso, o Grupo SOnHe escolheu maio para falar da saúde da Mulher no II Simpósio de Tumores Femininos de Campinas, que acontece entre os dias 17 e 18 de maio.

Quem é a mulher que adoece no Brasil?

Não é de costume começar um texto por sua resposta principal ou mais importante. Mas faço aqui uma exceção à regra e inicio pela parte que mais me toca nessa resposta: a mulher que adoece no Brasil é a mesma que sonha, que ama, que gesta, que trabalha, que cuida de tantos e de tudo.

Essa mulher é a que está ao seu lado. A que te ama, a que te cuida ou a que está dentro de você. Ela é cada uma de nós ou cada uma que está ao seu lado apoiando sua vida.

No Brasil, uma em cada oito mulheres nascidas hoje terão câncer de mama durante a vida, se viverem até os 60 anos. Dessas, 82% não tem nenhum antecedente familiar de câncer de mama.

O câncer de mama é ainda o principal tumor nas mulheres e também o responsável pelo maior número de óbitos no Brasil e no mundo. Mas, e no nosso Brasil, quem é a mulher que adoece de câncer de mama? Alguns pesquisadores iniciaram, em 2008, uma pesquisa com o objetivo principal de descrever quem são, como são e como é a doença nas mamas dessas brasileiras.

Numa série de estudos intitulada “AMAZONA I-III”, pesquisadores do Brasil todo nos deram a oportunidade única de conhecer melhor esse cenário. Uma das informações mais importantes foi que no Brasil temos 41% de pacientes com diagnóstico de câncer de mama em idade inferior a 50 anos, o que é uma proporção maior de diagnósticos em pacientes jovens do que em outros países, como Alemanha e Estados Unidos.

Esse número chama atenção para uma reflexão nas estratégias de rastreamento adotadas atualmente no nosso país, em que se recomenda a mamografia de rotina a partir dos 50 anos. A informação mostra que é necessário pensar em estratégias eficazes de rastreamento em idade inferior aos 50 anos na nossa população.

Outro dado que chama muito a atenção e traz preocupação é que o diagnóstico das nossas mulheres é feito em fase mais tardia da doença. Em torno de 71% das pacientes são diagnosticadas nos estádios II (46,8%) e III (24,6%), quando a doença já é localmente avançada, o que certamente impacta direta e negativamente na mortalidade das brasileiras. Esse número é consideravelmente mais alto do que em países desenvolvidos, como os Estados Unidos, com dados que mostram apenas 31% de pacientes com diagnóstico na fase localmente avançada da doença.

Em Campinas, o maior centro de tratamento de saúde feminina, com atendimento 100% público, recebe 500 novos casos de câncer de mama a cada ano, sendo que 40% dessas pacientes têm doença localmente avançada (estádio III) e 60% delas já têm sintomas ao diagnóstico. É um dado muito alarmante, pois é sabido e divulgado que o diagnóstico precoce de câncer de mama, no estádio I, quando ainda não existe nenhum sinal ou sintoma da doença, traz chance de cura superior à 90%.

No Brasil, apenas 18% das pacientes são diagnosticadas no estádio I, o mais precoce. Quando olhamos comparativamente e retrospectivamente, os dados de 2001 são muito semelhantes aos de 2018, sem melhoras nesse cenário.

Não menos importante é a constatação de que a saúde da mulher brasileira vive a mesma desigualdade que banha o Brasil por inteiro. As mulheres que são dependentes do Sistema Único de Saúde (SUS) têm consideravelmente diagnósticos mais tardios, em fase mais avançada da doença do que as que são tratadas na medicina privada, 36,9% versus 16,2%, respectivamente.

Isso mostra que apesar da estratégia de rastreamento para diagnóstico precoce estar disponível no Brasil, não está atingindo a nossa população de mulheres de forma eficaz, seja por que as mulheres não aderem ao exame oferecido, ou por heterogeneidade na distribuição desse recurso.

Outro tipo de câncer importante entre as mulheres e que também marca um tipo de desigualdade no nosso país é o câncer de colo uterino. Em estados da região Norte do Brasil esse é o primeiro câncer em incidência na mulher, ultrapassando o câncer de mama, que é o primeiro em incidência em todas as outras regiões, sendo um triste marco das diferenças socioeconômicas desse nosso país continental.

Esse dado vem carregado de um “pesar” que já nos acompanha há décadas, pois apesar de ser um câncer bastante prevenível, por meio da vacinação contra o vírus HPV e pelo teste de citologia oncótica do colo (exame papanicolau), temos uma altíssima incidência e mortalidade por essa doença no Brasil, em comparação aos países desenvolvidos, onde sua incidência é bastante baixa. Para 2018, a estimativa esperada foi de 16.370 casos novos, com um risco de 17,11 casos a cada 100 mil mulheres.

Outro tumor que também atinge as mulheres é o de ovário, com menor incidência (estima-se 6.150 casos novos no Brasil) mas que também merece atenção.

Voltando a falar da nossa mulher que sonha, que ama, que gesta, que trabalha, e que “cuida”, paro minha reflexão no verbo “cuidar”. O mesmo cuidado que nossas mulheres têm com seus filhos, netos, maridos e trabalho, deve ser destinado a ela, seja por parte da ciência, que tem o dever de melhorar o cenário da doença com novas descobertas (cada vez mais frequentes, é verdade!), seja por parte do governo, com melhor gestão assistencial, ou por ela mesma, voltando seu olhar para o seu próprio cuidado como forma de amor à vida.