O câncer de cabeça e pescoço, apesar de pouco discutido, apresenta um papel de destaque entre as neoplasias mais frequentes no Brasil. Estatísticas do Instituto Nacional do Câncer (INCA) estimam para os anos de 2018-2019, 14.700 novos casos de câncer de cavidade oral e 7.670 novos casos de câncer de laringe e, quando somados, ocupam o posto de terceiro tumor mais frequente nos homens brasileiros.
Essa neoplasia abrange todos os tumores que têm origem na boca (cavidade oral), nariz (nasofaringe, cavidade nasal e seios paranasais), garganta (orofaringe, hipofaringe, laringe) e nas glândulas salivares. O seu principal fator de risco é o tabagismo, sendo o risco de desenvolver câncer de cabeça e pescoço dependente do número de cigarros fumados por dia e seu tempo de uso. Tabagistas pesados têm o risco de desenvolver câncer de 5 a 25 vezes maior do que os não tabagistas. Diante desses dados é inevitável o questionamento: Podemos substituir o cigarro tradicional pelo cigarro eletrônico, cigarro light ou narguilé para evitar esse tipo de câncer? A resposta é NÃO.
O cigarro eletrônico é um dispositivo composto por um cartucho que armazena nicotina líquida, água, substâncias aromatizantes e solventes que, alimentado por uma bateria, produz um vapor com tais compostos. Erroneamente utilizado como uma ferramenta para cessar o tabagismo ou uma forma segura de “fumar”, o cigarro eletrônico vem ganhando mais adeptos em todo o mundo. Um estudo na população norte americana no período de 2010 a 2013 mostrou um aumento de 3,3 para 8,5 % de adultos que já fizerem o uso de cigarro eletrônico (King BA et al, Nicotine Tob Res. 2015).
O maior problema é que não existe evidência cientifica que comprove que o cigarro eletrônico é eficaz para cessar o tabagismo e que seja um hábito seguro para a saúde. Está comprovado que pode aumentar o risco de doenças cardiopulmonares, como infarto agudo do miocárdio e asma, e que contém substâncias potencialmente cancerígenas. A consequência da inalação crônica do vapor e das substâncias carcinogênicas ainda é pouco conhecida em relação ao risco de desenvolvimento do câncer de cabeça e pescoço. É provável que os malefícios causados pelo cigarro tradicional sejam maiores, porém isso não justifica o uso indiscriminado do cigarro eletrônico.
Já o cigarro light, desenvolvido na década de 1960, apresenta menores teores de alcatrão e nicotina e supostamente deveria ser mais “fraco” e com menor potencial de riscos à saúde. Infelizmente isso não é verdade. Para permitir uma maior diluição da fumaça, os filtros possuem pequenos orifícios/perfurações para a ventilação, permitindo a inalação de mais fumaça com taxas mais concentradas de carcinógenos e outras toxinas. Um estudo publicado em 2017 mostrou maior risco de câncer de pulmão, sub tipo adenocarcinoma, em pacientes tabagistas que fizerem uso do cigarro light (Song MA et al, J Natl Cancer Inst. 2017). Quando falamos especificamente sobre câncer de cabeça e pescoço, ainda não temos estudos avaliando a sua segurança, desta forma, assim como os cigarros tradicionais deve ser evitado.
Outra forma de consumo de tabaco que ganhou popularidade na última década é o narguilé. Uma espécie de cachimbo de água no qual o tabaco aromatizado é queimado, atravessa um recipiente com água e a fumaça é aspirada por uma mangueira até a boca.
Dados da Pesquisa Nacional de Saúde revelam um espantoso aumento de 139% no consumo de narguilé no período de 2008 a 2013 entre homens de 18 a 24 anos no Brasil.
Considerado inofensivo pela grande maioria dos usuários, pode ser mais perigoso que o tabagismo. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), consumir uma rodada do cachimbo é equivalente a fumar 100 cigarros. Os riscos para a saúde estão relacionados com inalação de monóxido de carbono, hidrocarbonetos aromáticos e aldeídos voláteis, que também são encontrados no cigarro. Estudo publicado em 2015 pelo Dr Teja Munshi, revelou aumento de lesões pré-malignas e câncer de cabeça e pescoço em usuários de narguilé (Munshi T et al, J Am Dent Assoc. 2015). O subtipo de câncer mais frequente foi carcinoma epidermóide, o mesmo encontrado nos pacientes tabagistas.
Tendo em vista tais pontuações, o cigarro eletrônico, cigarro light e o narguilé não são formas adequadas para o combate ao câncer de cabeça e pescoço. Muitas vezes difundidos como hábitos inofensivos, na realidade não são seguros e devem ser evitados. A melhor alternativa para reduzir o risco do câncer continua sendo a mesma: suspender o tabagismo, manter hábitos de vida saudáveis e fazer acompanhamento médico de rotina.