Pacientes com câncer de rim metastático que tratam pelo SUS poderão, finalmente, comemorar uma importante conquista!

O câncer de rim é o terceiro mais frequente do aparelho geniturinário, ficando atrás em termos de incidência dos cânceres de próstata e bexiga. Representa aproximadamente 3% das neoplasias malignas do adulto. Estatísticas americanas estimam uma incidência anual em torno de 51 mil novos casos, sendo responsável por aproximadamente 13 mil mortes/ano. Infelizmente não temos dados oficiais de incidência e mortalidade no Brasil. Há ligeiro predomínio de incidência no sexo masculino, na razão de 3:2.

O tipo histológico mais comum é o câncer renal de células claras, responsável por 85% dos tumores diagnosticados. A maioria dos pacientes são acometidos pela forma esporádica da doença, com pico de incidência entre a 6ª e 7ª década de vida. Contudo, 2% dos pacientes desenvolvem a doença em idades mais precoces, geralmente relacionada às síndromes genéticas como von Hippel-Lindau e Li-Fraumeni.

Os fatores etiológicos relacionados à predisposição da neoplasia renal podem ser divididos em fatores evitáveis, relacionados aos hábitos de vida da população, como o tabagismo e a obesidade, e aos fatores não evitáveis, relacionados às doenças associadas como a hipertensão arterial crônica e a doença renal cística adquirida associada à insuficiência renal crônica. O tabagismo isolado é responsável por 19% casos.

Aproximadamente 54% dos tumores renais diagnosticados hoje estão confinados ao rim, 20% são localmente avançados (acometendo gânglios regionais próximos ao rim) e 25% já apresentam metástases à distância da doença, principalmente para os pulmões, fígado e ossos.

Nos pacientes com câncer de rim com doença localizada ou localmente avançada e sem metástases a distância, a cirurgia oncológica realizada por profissional médico qualificado permanece como tratamento padrão. Já nos pacientes com doença disseminada, ou seja, metastática, é necessário algum tratamento que tenha ação em todos os locais onde se tem evidência de doença, o que chamamos de tratamento sistêmico. A quimioterapia convencional citotóxica tem pouca eficácia no câncer de rim e, por isso, não é utilizada de rotina.

Nos dias atuais, um dos principais tratamentos para pacientes com doença metastática é a classe de drogas conhecidas como inibidores de tirosino-quinases (TKIs), como por exemplo o Sunitinibe e o Pazopanibe. Essas medicações, conhecidas como drogas-alvo, agem em vias específicas do tumor, levando em última análise a morte da célula tumoral. Estudos mais recentes mostraram o papel da imunoterapia no tratamento destes pacientes. Diferente da quimioterapia convencional e mesmo das drogas-alvo, os imunoterápicos agem estimulando nosso sistema imunológico no combate ao câncer. A imunoterapia se mostrou superior em termos de aumentar a sobrevida dos pacientes em relação ao Sunitinibe.

Recentemente, uma nova estratégia terapêutica foi estudada no contexto de doença disseminada: a associação de imunoterapia com inibidor de tirosino-quinase (droga-alvo). Os resultados em termos de sobrevida são animadores e num futuro próximo este deverá ser o novo padrão de tratamento neste cenário.

Apesar de todo avanço no arsenal terapêutico no câncer renal metastático ocorrido principalmente na última década, a realidade dos pacientes que necessitam do Sistema Único de Saúde (SUS) como fonte pagadora do tratamento é desanimadora. O valor mensal repassado aos serviços públicos ou privados que prestam atendimento ao SUS para cada paciente com tumor renal maligno em tratamento é de R$ 571,50, o que permite apenas uso de drogas obsoletas, com pouca efetividade clínica contra o tumor e com perfil de efeitos colaterais desfavorável. No Brasil, na maioria dos casos, pacientes com câncer do sistema de saúde público demoram mais para ter acesso aos diversos medicamentos de eficácia comprovada que podem dar mais qualidade e expectativa de vida. Para os pacientes da rede pública, o tratamento até hoje disponível, o Interferon-alfa, não estava associado a melhora na sobrevida global e tampouco demonstrou evidências significativas de ganho de qualidade de vida e/ou alívio de sintomas, além de elevada toxicidade, posologia complexa, e taxas de resposta objetiva menores que 20%.

Há algum tempo, a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), em associação com outras entidades de apoio ao paciente com câncer, vem lutando junto ao Ministério da Saúde (MS) pela incorporação da terapia-alvo (TKIs) contra o câncer renal no rol de procedimentos oncológico do SUS. No dia 28 de dezembro de 2018, o MS editou a Portaria 91 que incorpora o Pazopanibe e Sunitinibe ao SUS para o tratamento de pacientes com carcinoma renal de células claras metastático. A medida tem 180 dias para entrar em vigor. O Sunitinibe foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) há 12 anos. O Pazopanibe há 7. E ambos já são cobertos pelos planos de saúde aos seus pacientes há pelo menos quatro anos. Esperamos que a partir de junho de 2019 – prazo máximo para início do uso dos medicamentos no SUS – os pacientes que dependem da saúde pública possam também se beneficiar de um tratamento mais eficaz e que comprovadamente aumenta a sobrevida.