A imunoterapia tem se destacado nos últimos anos como o tratamento mais promissor no controle e no combate ao câncer em fases mais avançadas, com metástases para outros órgãos. Desde 2010, algumas drogas desta classe já estão disponíveis no mundo e no Brasil e o número de medicamentos certamente vai aumentar nos próximos anos.

O nosso sistema imunológico tem a capacidade de reconhecer células alteradas (anormais) ou outros microrganismos – tais como bactérias e vírus – circulando pelo corpo e, a partir disso, destrói essas células ou microrganismos. Para isso, conta com um arsenal de mecanismos de defesa, orquestrados pelos linfócitos. Os linfócitos são as nossas células mais importantes de defesa. São como soldados do nosso corpo.

O que acontece quando temos um tumor, é que nossos soldados (linfócitos) começam a atacar as células tumorais. Porém, com o passar do tempo, o tumor é capaz de produzir e expressar proteínas que inibem a ação dos linfócitos. É como se, com o tempo, os linfócitos ficassem mais fracos e cansados e parassem de combater o tumor. Com isso, o câncer tem sinal verde para crescer e se espalhar.

Dois grandes pesquisadores, os médicos imunologistas James P. Allison, da Universidade do Texas e do Centro MD Anderson, Houston, nos EUA, e Tasuko Honjo, da Universidade de Kyoto, no Japão, identificaram duas dessas proteínas que nocauteiam os linfócitos e, a partir disso, ajudaram no desenvolvimento de medicamentos que permitem o sistema imunológico se reativar e atacar o câncer novamente de forma mais eficaz. É como se os nossos soldados que estavam cansados voltassem a ter energia para combater as células cancerígenas.

Essas descobertas estão mudando a forma como tratamos vários tipos de câncer e têm trazido um aumento na qualidade de vida e no tempo de vida dos pacientes; um avanço nunca antes visto com a quimioterapia convencional.  Alguns pacientes atingem a cura, o que era impensável para um câncer metastático até alguns anos atrás.

As descobertas levaram James Allison e Tasuko Honjo ganharem, juntos, o Prêmio Nobel de Medicina de 2018, divulgado em 1º de outubro de 2018, dada a importância de suas descobertas. J. Allison relatou pela primeira vez a via do CTLA-4, a partir da qual se desenvolveu o medicamento ipilimumab, o primeiro a aumentar o tempo de vida de pacientes com um câncer de pele chamado melanoma, depois de anos de pesquisas frustradas com quimioterapia. Já Tasuko identificou a via de inibição do PD-1, a partir da qual se desenvolveu as medicações anti PD-1 e anti PDL-1, como nivolumab, pembrolizumab, atezolizumab, durvalumab, avelumab e outras. Hoje, estas medicações já são usadas com resultados animadores no tratamento de tumores de pele, pulmão, rim, cabeça e pescoço e, certamente, serão usadas em vários outros tumores.

Como estes medicamentos reativam o sistema imune, eles não são isentos de efeitos colaterais. E os efeitos mais comuns estão justamente relacionados à um ataque daqueles soldados (linfócitos) contra células sadias do nosso corpo, causando processo inflamatório e, eventualmente, destruição de vários órgãos, tais como pulmão, fígado, pele, glândulas. A vantagem é que estes efeitos não são tão comuns e, quando acontecem, tendem a ser brandos.

Vivemos uma nova era no tratamento do câncer e a compreensão de como nosso sistema imunológico atua neste processo nos tem permitido alçar voos mais altos. E, graças aos médicos e pesquisadores como J. Allison e Tasuko Honjo, mais pacientes com câncer avançado têm vivido por mais tempo e com mais qualidade de vida. Prêmio mais do que merecido e que estimula mais investimentos na descoberta de novos tratamentos contra o câncer.