Atualmente, em Oncologia, a busca por qualidade de vida durante toda a trajetória da doença e do tratamento tem sido um dos mais importantes objetivos de cuidado. Este tema tem sido amplamente discutido em fóruns científicos mundiais e nacionais, o que têm fomentado não só novas abordagens de cuidado, como também diversas políticas públicas, com a intenção de estimular uma atenção integral aos pacientes oncológicos.
Nesse sentido, o chamado cuidado paliativo – ou de suporte – vem ganhando espaço e demonstrando sua tamanha importância na assistência plena a esses pacientes. Trata-se, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), de uma abordagem capaz de melhorar a qualidade de vida de pacientes e famílias que enfrentam enfermidade ameaçadora da continuidade da vida. Além disso, tem função também na prevenção e no alívio de sofrimentos, por meio da identificação precoce, do manejo e do controle de dor, assim como de outras questões de cunho psicológico, psicossocial e espiritual.
Há quase dez anos, evidência científica robusta já demonstrou, com estudo científico randomizado realizado em pacientes com câncer de pulmão, que a introdução precoce dos cuidados paliativos levou a melhora não só do humor, como também da qualidade de vida e proporcionou sobrevida.
Diante dos benefícios tão expressivos que têm sido demonstrados em relação a esse tipo de cuidado ao longo do tempo, em 2017, na Reunião Anual da American Society of Clinical Oncology (ASCO), foi atualizada a Opinião Clínica Provisória (PCO) de 2012 a respeito do melhor momento para integrar os cuidados paliativos no atendimento ao paciente. Assim, ficou recomendado que a equipe paliativista deveria ser consultada no máximo em até oito semanas após o diagnóstico de um câncer avançado, simultaneamente ao início do tratamento oncológico específico.
Para além disso, ainda em 2017, ganhou espaço em sessão de plenária da ASCO, onde são apresentados os trabalhos científicos mais relevantes em Oncologia, um estudo científico que teve como objetivo avaliar o impacto da avaliação proativa dos sintomas dos pacientes. Este tipo de abordagem melhorou qualidade de vida, diminuiu procura aos serviços de emergência de hospitais e aumentou tempo de sobrevida em cerca de cinco meses.
No mês passado, neste mesmo Congresso, o tema do cuidado paliativo foi novamente valorizado e os estudos de maior evidência trouxeram novos questionamentos a respeito do melhor momento para iniciar a abordagem, a melhor maneira de fazê-lo em diferentes contextos e cenários (intra ou extra-hospitalar, em diferentes regiões do mundo) e a alocação recursos para tal.
Um dos estudos ressaltados avaliou retrospectivamente o impacto da introdução ainda mais precoce do cuidado paliativo, com quatro semanas do diagnóstico, utilizando-se da base de dados americana SEER, em pacientes com câncer de pâncreas avançado. Como resultado, foi evidenciado uma diminuição expressiva da procura por serviços de emergência. Apesar da importância deste cuidado também na Medicina Intensiva estar bem consolidada, infelizmente neste estudo especificamente não foi possível demonstrar diminuição significativa do número de internações em UTI.
Outra análise retrospectiva importante avaliou o impacto da integração do cuidado paliativo em 810 pacientes com câncer avançado, no contexto intra-hospitalar, validando a importância do acompanhamento precoce também neste cenário e, principalmente, desde à admissão na internação. O trabalho ainda evidenciou que pacientes recebendo esse tipo de abordagem tinham 1,2 vezes mais chance de alta para casa.
Apesar dos resultados animadores em relação às pesquisas no contexto do cuidado paliativo, não podemos deixar de considerar os desafios da avaliação do real impacto dos estudos retrospectivos. No entanto, eles nos ajudam a saber como este tipo de abordagem tem sido feita ao redor do mundo. Faz-se necessário ainda definir o modelo mais efetivo de integração do cuidado, o melhor momento para isto, para quem e por qual motivo.
Diante do exposto, fica claro que cada vez mais o cuidado paliativo, associado às práticas que visem melhorar a qualidade de vida, tem se consolidado como abordagem essencial de cuidado a ser instituída cada vez mais precocemente na trajetória de um paciente oncológico e em diferentes contextos. Não podemos deixar de ter em mente que o médico oncologista e paliativista sempre devem ser consultados para avaliar e auxiliar na integração de práticas não convencionais de cuidado.
O paciente oncológico necessita – além do alívio e da prevenção dos seus sintomas físicos – de abordagem de outros tipos de sofrimentos, que têm suas origens também no espírito e na mente, considerando seu contexto familiar, sua biografia, suas novas prioridades de vida traçadas a partir do diagnóstico e o legado simbólico e/ou concreto que deseja deixar. O cuidado paliativo abre uma porta para um acolhimento diferenciado, por meio da criação de vínculos fortes e de redes de apoio amplas, que têm o poder de mudar não só a evolução da doença, como também a forma como o indivíduo se enxerga e se coloca no mundo.