O que tivemos de novo no tratamento do câncer de mama no final de 2017?
O melhor do San Antonio Breast Cancer Symposium
Há 40 anos especialistas do Mundo todo se reúnem no mês natalino, na cidade de San Antonio-Texas, a fim de apresentar novas perspectivas no tratamento do câncer de mama. Na última década foi lá mesmo que se apresentaram os mais importantes estudos que mudaram a vida de mulheres ao redor do mundo, e esse ano não foi diferente.
Médicos que tratam câncer de mama sabem que a dor e a rigidez nas articulações são os efeitos colaterais mais frequentes dos inibidores da aromatase, que é uma das classes de remédio mais usada no tratamento das pacientes que tem câncer de mama do subtipo luminal, isto é, que expressam receptores hormonais. As dores decorrentes do tratamento implicam em piora significativa na qualidade de vida e fazem com que frequentemente as pacientes abandonem o uso da medicação.
De acordo com os resultados de um grande estudo clínico randomizado, a acupuntura administrada duas vezes por semana durante 6 semanas melhora a dor e rigidez nas articulações entre as mulheres em tratamento com inibidores da aromatase.
Ainda com relação ao tratamento desse mesmo subtipo de câncer de mama, dito “hormonal” tivemos a apresentação de um importante estudo, em que 3484 mulheres pós-menopáusicas com câncer de mama estadio I-III foram distribuídas para receber 2 ou 5 anos de anastrazol, 1 mg/dia, sendo que todas as mulheres tinham sido tratadas com 4 a 6 anos de terapia endócrina com tamoxifeno, inibidor de aromatase ou a combinação dos dois.
O estudo mostrou que o câncer de mama desse subtipo possui um risco significativo de recaída a longo prazo, sendo que mais de 50% das recidivas ocorrem após os primeiros 5 anos de seguimento, e por conseguinte, tem sido uma tendência o prolongamento da duração da terapia hormonal adjuvante.
Os dados do estudo mostraram que o risco de recaída foi o mesmo para as mulheres que receberam 2 e 5 anos extra de tratamento, porém as pacientes que usaram apenas 7 anos de tratamento hormonal tiveram menos efeitos adversos na saúde óssea, potencialmente protegendo as mulheres contra as fraturas.
Esses dados fazem com que adotemos 7 anos de tratamento adjuvante para a maioria das pacientes, ao invés de 10 anos.
Entretanto, é importante observar que nesse estudo 70% das pacientes tinham doença inicial (tumores menores que 2 cm e sem linfonodos doentes), fazendo com que ainda tenhamos dúvidas quanto ao uso de tratamentos mais prolongados para mulheres com doença de maior risco.
Outro importante ponto abordado foi a gravidez após o tratamento do câncer de mama. O que pode ser particularmente desafiador devido ao desenvolvimento de uma possível infertilidade pelo uso de quimioterapia.
Sobre esse tema foi apresentada uma uma meta-análise de cinco estudos avaliando o uso de um análogo de GnRH em mulheres jovens submetidas à quimioterapia, estratégia que se mostrou eficaz em preservar a função ovariana e a fertilidade.
Após 2 anos de tratamento, as taxas de amenorréia foram reduzidas para metade entre as pacientes que utilizaram a medicação, e mais importante ainda, 10,3% do grupo GnRH conseguiram engravidar após o término do tratamento, em comparação com 5,5% daquelas que não receberam o tratamento.
Uma outra metanálise que merece ser destacada compilou os dados de 25 estudos, que avaliaram a intensificação da quimioterapia adjuvante, reduzindo o intervalo do esquema AC de 21 dias para 14 dias, o que chamamos de “dose dense”.
O estudo mostrou que após 10 anos, o risco de recorrência foi 4,4% menor a favor da intensificação da dose.
É importante ressaltar que as toxicidades não foram significativamente maiores no esquema “dose dense”, desde que sejam usados estimuladores do crescimento de células da imunidade. Com esses dados o esquema dose dense torna-se uma importante opção de tratamento.
Com relação ao tratamento das pacientes com doença metastática as notícias são cada dia mais animadoras. Alegro-me em perceber que assim como eu, existem pesquisadores no Mundo todo que demonstram seu inconformismo em ainda não termos a cura para o câncer de mama metastático.
Existe uma nova classe de medicação, que há alguns anos está se mostrando eficaz no tratamento do câncer de mama metastático do subtipo luminal, são os inibidores de CDK4 / 6.
No recém apresentado estudo, foi demonstrado que o ribociclib traz grandes benefícios clínicos também para as mulheres na pré-menopausa. A associação do ribociclib à terapia endócrina padrão melhora a sobrevida livre de progressão, reduzindo pela metade a chance de aumento da doença, traduzindo-se em 24 meses de uso de tratamento sem nenhuma progressão.
É Importante ressaltar que a qualidade de vida relatada pelas pacientes que usaram a medicação foi superior, pois a grande maioria obteve melhora dos sintomas de dor relacionada às metástases, já com 8 semanas do tratamento, sendo que a toxicidade da nova droga não é alta.
Ainda não temos essa droga no Brasil.
Outra classe de fármacos que ganha cada vez mais espaço são os inibidores da PARP, e dessa vez foram apresentados os primeiros resultados do maior estudo clínico randomizado realizado no grupo de pacientes com câncer de mama hereditário (mutações no BRCA 1 e 2). No estudo, o talazoparib demonstrou benefício clínico superior em todos os subconjuntos de pacientes, independente do subtipo de receptor, número de linhas anteriores de quimioterapia, tipo de mutação BRCA ou presença de metástase no sistema nervoso central.
Em um seguimento médio de 11,2 meses, a sobrevida livre de progressão da doença foi 46% maior para as pacientes em uso da nova medicação em comparação com a quimioterapia padrão.Ainda não temos essa droga no Brasil.
O último estudo que gostaria de mencionar, ainda no cenário do tratamento do câncer de mama metastático, destina-se ao subtipo triplo negativo.
Na última década os avanços foram maiores para outros subtipos do câncer de mama (Her 2 positivo e luminal), fazendo com que a notícia de novas estratégias promissoras no tratamento do tumor triplo negativo seja muito desejada e aguardada.
Hoje sabemos que existem diferentes subtipos de tumores triplo negativos, incluindo uma vasta diversidade de caminhos moleculares e alterações genéticas. Assim sendo, desvendar as novas vias moleculares me parece crucial na melhora dos desfechos que tanto almejamos.
Com essa perspectiva, o desenvolvimento de uma abordagem conjugada de anticorpo monoclonal + quimioterapia é um passo na direção do tratamento do câncer triplo negativo. Usando esse racional, o sacituzumab-govitecan (anticorpo anti-TROP 2 associado ao metabólito ativo do irinotecano), mostrou taxa de resposta de 30% com benefício clínico de 46% em pacientes que já receberam diversas linhas de tratamentos prévios. A mediana de sobrevida global foi de 16 meses, lembrando que trata-se de um estudo que incluiu pacientes poli-tratadas para câncer metastático, esse é um número animador. Os dados são particularmente promissores, pois as respostas objetivas e a estabilização prolongada da doença não são frequentes em pacientes com câncer de mama metastático triplo negativo já refratário aos tratamentos anteriores.
Foram ótimas notícias no final de 2017 e desejamos um 2018 ainda mais promissor no tratamento do câncer de mama.