Carnaval e câncer de cabeça e pescoço: O que tem em comum?

O carnaval, considerada a maior festa popular brasileira, é conhecido pela intensa diversão entre os seus foliões. Muitas vezes esses momentos são acompanhados por exageros com bebidas alcóolicas, cigarro e relações sexuais desprotegidas, causando transmissão de doenças sexualmente transmissíveis, dentre elas o HPV (Papiloma Vírus Humano). Quando exposto cronicamente a essa tríade, devemos sempre lembrar do risco de câncer de cabeça e pescoço.

Esse câncer compreende todos os tumores que tem origem na boca (cavidade oral), nariz (nasofaringe, cavidade nasal e seios paranasais), garganta (orofaringe, hipofaringe, laringe) e nas glândulas salivares. É um tema pouco discutido mas de grande importância para saúde. Estatísticas mundiais revelam que é o sexto câncer mais frequente. O Instituto Nacional do Câncer (INCA) estimou para 2016, cerca de 15.490 mil novos casos, mais especificamente de câncer de cavidade oral, atingindo o posto de quinto tumor mais frequente nos homens brasileiros. Os homens são mais acometidos com uma razão de 2 a 4 homens para cada mulher, sendo a grande maioria dos diagnósticos realizados em estágios avançados.

Como podemos mudar então essa estatística tão alarmante? A resposta é simples: compreender os 3 principais fatores de risco e combatê-los.

O primeiro fator é o tabagismo, sendo o risco de desenvolver câncer de cabeça e pescoço dependente do número de cigarros fumados por dia e tempo de uso. Tabagistas pesados têm o risco de desenvolver câncer 5 a 25 vezes mais do que os não tabagistas. Importante ressaltar que não apenas o cigarro e o cachimbo aumentam esse risco, o hábito de mascar fumo ou tabaco, o uso de narguilé, cada vez mais frequente no Brasil, também está associado a um risco aumentado de câncer de boca e faringe.

O segundo fator é o etilismo que, assim como o tabagismo, está relacionado com a dose ingerida durante a vida. Um estudo realizado no Uruguai revelou o aumento de 5 a 6 vezes no risco de desenvolver o câncer de cabeça e pescoço com consumo de álcool superior a 50 g/dia versus menos de 10 g/dia (uma bebida contém aproximadamente 12 g de álcool). Ainda mais importante ressaltar que, quando associados, os hábitos de etilismo e tabagismo multiplicam o risco de câncer.

O terceiro fator que ganha cada vez mais visibilidade é a infecção pelo vírus HPV, estando este relacionado ao desenvolvimento do câncer de orofaringe (garganta). O HPV é o mesmo vírus relacionado ao câncer de colo de útero, vagina, vulva, anus e pênis. Dentre os 150 subtipos de HPV, o mais relacionado ao câncer de cabeça e pescoço é o subtipo 16. Diferentemente dos outros fatores de risco acima citados, ele é responsável por câncer em pacientes mais jovens e sem hábito de tabagismo e etilismo. Sabemos que esses tumores relacionados a infecção pelo vírus apresentam uma melhor resposta ao tratamento, mas a melhor notícia é que a vacinação contra o HPV protege contra esse tipo de câncer.

E quando devemos suspeitar de um câncer de cabeça e pescoço? Atentar para feridas na boca que não cicatrizam, dor ou irritação persistente da boca ou garganta, placas avermelhadas ou esbranquiçadas que duram mais de 3 semanas, alteração da voz ou dificuldade de deglutir.

Caso tenha algum desses sintomas é fundamental passar por avaliação com um dentista, cirurgião cabeça e pescoço ou otorrinolaringologista para investigação do quadro e mesmo para uma biópsia se a lesão for suspeita.

O diagnóstico de câncer apenas é confirmado com a biópsia. O tratamento deve ser feito com uma equipe multidisciplinar composta por um cirurgião de cabeça e pescoço, oncologista, radioterapeuta, nutricionista, fonoaudióloga e psicóloga. O tratamento depende da localização e do tamanho do tumor, sendo opções a cirurgia, radioterapia e quimioterapia. Em situações específicas todas as 3 opções são utilizadas para melhor resposta ao tratamento e aumento das chances de cura.

Como a maioria dos canceres, o diagnóstico precoce aumenta as chances de cura e possibilita tratamentos com menos sequelas, mas o mais importante é a conscientização de que podemos reduzir o risco desse tumor se for evitada a exposição aos fatores de risco. Não fumar, não abusar de bebida alcóolica e ter relações sexuais protegidas deve ser o primeiro passo. Vale ressaltar que a vacinação contra o HPV disponível no SUS protege contra os a infecção por esse vírus e reduz o risco de câncer de cabeça e pescoço (orofaringe), colo de útero, vagina, canal anal e pênis. As indicações para a vacinação de acordo com o Ministério da Saúde são: Meninas e meninos dos 9 aos 14 anos, pacientes com câncer em quimioterapia ou radioterapia, transplantados e portadores de HIV entre 9 a 26 anos. Fora dessas indicações a vacinação pode ser realizada no sistema privado. Diante de todos esses benefícios, não deixe de vacinar seus filhos.

O carnaval está chegando e todos devem aproveitar com muita alegria. O uso esporádico de bebidas e cigarro não é o maior vilão para o câncer, mas vale lembrar que esses hábitos muitas vezes se iniciam nessas comemorações. Portanto, diga não ao tabagismo, não ao abuso de bebidas alcóolicas e lembre-se sempre de usar camisinha!